A casa de Dona Alzira é essa imensa moita, um manancial de jeitos verdes. Dizem que a construção aqui no Cruzeiro é da década de 20. Tem bananeira, roseira, dama da noite, espada de São Jorge, costela de Adão e muito feitiço. Eu sempre admirei a pintura, esse desbunde de vida que aparece na minha janela. Mas quando lá pisei, parecia um portal. De beleza, calma e abundância. O tempo se esticou. Como é que a vida muda tanto de um muro pro outro? Eu queria ser neta de Dona Alzira, pra poder pisar na terra todo dia, olhar pra cima e ver o teto estrelado do mundo, ouvir muitos silêncios dentro do café da tarde. Teve uma época que uma moça morava com ela. Todo dia a gente se falava da janela e ela, a moça, achava que eu era gêmea de mim mesma. Eu ria e sustentava a história. Engraçado, a gente vai se acostumando com as coisas na cidade, como por exemplo, não conseguir ver a lua quando enche. Vamos atrofiando o nosso corpo dentro dos ângulos dos apartamentos e inflando as cabeças de tanto engolir as telas. O dia intirim…Eu não sei vocês, mas eu sou filha do mato, da terra vermelha, do espinho, do caroço da fruta, daquela rebeldia toda, cheia de presença e constância. Salve Dona Alzira que sabia desfiar o tempo como ninguém, só capinando, capinando, capinando… Sonho em algum dia voltar para um lugar onde ainda não vivi. Um lugar de brisa fresca e cheiro bom da alma do mundo me dando um abraço folhoso! 🍃
Foto: Isadora Fonseca